quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

ESPINHO NO DEDO

Deus da Silva
(vulgo Geraldo Vasconcelos de Jesus
)

INTRODUÇÃO

Em 1971 marquei um “ponto” com uma garota no Campo da Pólvora. Era ditadura Médici e iria receber programa, estatuto, etc, da APML do B, a Ação Popular Marxista Leninista do Brasil, uma das organizações de oposição ao governo militar. Até então executara tarefas prosaicas (pichações de muros e paredes de casas, panfletagens, guarda de livros “proibidos”,cessão de casa para reuniões), era um simples militante, era “massa”, digamos, sem maiores vínculos partidários. No encontro, talvez intuitivamente ( até hoje não sei) recusei entrar para a A P. ( umas 2 semanas depois a guerrilheira foi presa, junto com vários outros, dedurada por seu namorado).Em 69, no Ginásio Salesiano, tradicional colégio de padres, um colega de sala apresenta-me um exemplar do“Pasquim”. Era, com a censura férrea da época, como oferecer um caminhão de feijão a um esfomeado: amor a primeira vista (e não houve indigestão). Logo apresso-me a pedir os números anteriores do jornalzinho e a sua leitura se torna uma constante.Aliás, este mesmo colega – esqueço o seu nome no momento – “introduziu-me” ao ateísmo: de coroinha transfiguro-me num herege em pleno estabelecimento de ensino católico.Quanto ao Pasquim ( junto com “Movimento”,“Opinião”, “Polityka”, “Ex-“, “Em Tempo”,“Argumento”, etc, etc) foi devidamente atirado ao lixo, rasgado numa de minhas crises de “expurgo do passado”.

71. Abandono o segundo ano colegial, no Central,conhecido colégio público de Salvador, pouco antes das provas finais, que nem fui realizar. Incarnei-me em Bernard Shaw ou Paulo Francis (saudades de P. F., suas idiossincrasias, sua lacuna dolorosa): “para quê estudar, de que irá me servir tudo isso que me ensinam?”, por aí.

O ano de 72 torna-se uma seqüência de atividades
erráticas, vagabundas: era o meu underground. Publico
um livro (“Flor de Lótus”), mimeo com uns 10 ou 12
exemplares (44 páginas) de pura encucação. Vou muito a
praia, leio taoismo, zen-budismo, “Caminhos da Liberdade”
(Sartre – escritor – ensinou-me : torno-me existencialista),
tento entender Reich e Jung, leio também Fitzgerald,
o extraordinário Kafka,Dostoievski, Machado, Rosa,
Drummond, Virgínia Woolf(Lispector, não sei, nunca li;
mas também nunca li Proust nem O Pequeno Príncipe;
e Ulisses lerei algum dia), Heminghay, Graciliano, etc, etc,
mas, não sei,nunca gostei da “filosofia tradicional”,
seja lá o que isto for (refiro-me a Kierkegaard,
Nietzsche, Kant e outros). Leio jornais
( um dia, lembro, na cama, o
impacto da manchete “Lamarca Morre”),
continuo com o Pasquim (que apresentou-me a
Millôr, Itararé, Ponte Preta, W. Allen,
L.F. Veríssimo, Irmãos Marx, I. Lessa– humor,
disse o Pitigrilli, “é uma criança no escuro
cantando para esconder o medo”, o k. ; descubro o
underground de Maciel) faço (ou tento) macrobiótica,
deixo cabelos crescer , enfim, torno-me um hippie
“caseiro”, só teoria, sem drogas (anos depois
experimentaria maconha e coca, valeu, certo, mas não é a minha).
Conheci o “Verbo Encantado”, jornaleco da
contracultura baiana, a sede era, creio, na cidade
baixa, no Contorno.
(Um dia bate a minha porta um amigo de rua dizendo que fora solto do exército naquele dia; atendi-o friamente, arrependo-me até hoje)

Em 73 retorno ao estudo. “Se o estupro é
inevitável...” Prefiro, por precaução, um daqueles
colégios “pagou-passou”, mas, tudo bem, com meus
conhecimentos do Salesiano (sempre em primeiro ou
segundo lugar, era um c.d.f.) curso numa boa, quase
sem estudar (“revia” os assuntos), apenas curtindo os
coleguinhas filhos de papai com merda na cabeça.
Colaboro num suplemento literário do antigo
J. da Bahia, criando um alter ego, o Alberto Font(...)

*Fragmento do livro :"Espinho no Dedo"
(amigo do Orkut,"Deus da Silva",
vulgo Geraldo Vasconcelos de Jesus.)
Camaçari - Bahia

*"Espinho no Dedo" - Explicação sobre o nome do livro:
O jornalista Ruy Castro, numa de suas traduções de Woody Allen, lembrou-se do escritor americano Nathanael West, que “tinha um espinho no dedo que geralmente não doía. Só quando escrevia”. Pois é, este livro machucou-me muito.

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